Preparação de crianças
hospitalizadas para procedimentos médicos:
O que o psicólogo pode fazer?
INTRODUÇÃO
O
presente relatório trata-se de uma revisão de literatura que tem por objetivo
explanar os aspectos acerca da internação pediátrica e da preparação da criança
para procedimentos médicos. Em meio ao período de descoberta do mundo, a
criança se depara com a doença, o que Segundo Calvetti e Cols. (2008), não é
previsto e nem planejado para sua vida, ocorrendo assim, uma interrupção em seu
desenvolvimento.
Mesquita
e Cols. (2013) colocam que a infância é um período de grande desenvolvimento
físico e psíquico. A criança ainda está construindo seu repertório de
experiências, precisando de apoio para enfrentar os possíveis efeitos negativos
que podem advir de eventos traumáticos, assim como a insegurança, o medo e a
ansiedade decorrentes de uma hospitalização. Segundo Calvetti e Cols. (2008) a
doença altera a rotina dos pacientes, privando-os do lazer e do convívio com
família e amigos. A experiência do adoecimento é singular a cada sujeito. Cada
pessoa vive sua dor de forma única.
De
acordo com Calvetti e Cols. (2008) faz-se importante ouvir o sujeito que está
enfermo, fragilizado e hospitalizado, sendo o profissional afetivo e buscando
acolher o paciente em sua totalidade. É comum que familiares e profissionais
minimizem ou desconsiderem as percepções e sentimentos da pessoa hospitalizada,
tais atitudes podem contribuir para a insegurança e instabilidade do paciente.
É importante adotar uma postura cuidadosa com a criança, estando ciente que
este paciente possui desejos e sentimentos a serem expressos em seu processo de
hospitalização. O profissional precisa compreender sobre o desenvolvimento
humano da criança, tendo uma visão ampliada, e não somente centrada na doença.
É necessário garantir o direito a confidencialidade e privacidade. Tendo uma
atitude de respeito pela autonomia da criança e responsabilidade na atenção à
sua saúde. Sendo comum à criança hospitalizada ter seu espaço e intimidade
invadidos pela equipe, que se tratam de pessoas desconhecidas para ela. Quando
a criança se sente ouvida e valorizada, tende a expressar suas dificuldades
relacionadas à hospitalização e à enfermidade, o que auxilia em seu processo de
recuperação. A criança tende a expressar o medo por ficar sozinha, por perder
ou se afastar dos pais, por não voltar para casa, ou não ter mais seus amigos e
brinquedos.
DESENVOLVIMENTO
De
acordo com Huerta (1996) qualquer intervenção cirúrgica representa uma situação
critica que gera uma crise vital no indivíduo. Globalmente e por muito tempo as
crianças eram levadas às salas de cirurgia sem terem consciência do que
aconteceria com elas, pensava-se que seria melhor não gerar ansiedade e medo
antecipado na criança, da mesma forma que acreditava-se também ser melhor não
discutir com elas sobre a experiência que haviam passado após a cirurgia, pois
acreditava-se que esqueceriam rapidamente. A mesma autora coloca que
posteriormente, após a realização de pesquisas e estudos foi garantido o
direito da criança de saber a verdade sobre sua realidade e as experiências que
enfrentaria em cirurgia.
Huerta
(1996) alerta que na maioria dos casos oculta-se dos pacientes informações
sobre os procedimentos aos quais serão submetidos. As crianças hospitalizadas,
também são enganadas, tanto pela equipe de saúde quanto pelos pais quanto aos
procedimentos e seus propósitos. Acredita-se que o receio de não saber lidar
com as possíveis reações da criança faça com que pais e equipe optem por
omitir, ocultar informações ou mentir sobre o real estado da criança e sobre os
procedimentos aos quais será submetida. Huerta (1996) coloca que a criança que
não foi preparada corretamente pode desenvolver fobias, pesadelos, insônia,
enurese, medo de pessoas vestidas de branco, agressividade, etc. Também pode
perceber a experiência como um ataque hostil, como uma violência ou abuso, o
que pode levá-la a perder a confiança nos adultos, especialmente nos mais
significativos em sua vida, como seus pais, tal confiança é essencial para um
desenvolvimento emocional saudável. A ocultação de informações e a mentira
sobre o procedimento médico ou sua finalidade estão diretamente ligadas aos
sintomas emocionais posteriores. Em contrapartida, a criança que foi
adequadamente preparada diminui o potencial traumático da situação, diminuindo
os sintomas emocionais além de reduzir o medo.
Ainda
segundo Huerta (1996), ao preparar uma criança para este tipo de situação é
necessário estar atento a idade da criança e seu desenvolvimento da
compreensão. Além de avaliar as características individuais da criança, como
por exemplo, se já teve experiências anteriores de hospitalizações, cirurgias e
outras intervenções médicas e como foram, ou o que representaram estas
experiências. Também é interessante verificar se algo mais de significativo
está ocorrendo na vida da criança naquele momento, como entrada na escola,
nascimento de irmãos, falecimento de entes queridos ou animais de estimação,
etc. É essencial também conhecer o tipo de procedimento pelo qual a criança vai
passar, além de avaliar a percepção tanto da criança quanto de seus pais sobre
a situação atual e verificar a possibilidade de a mãe ou outro adulto
significativo permanecer no hospital com a criança, sendo acompanhante ou
participante ativo de seus cuidados. Huerta (1996) coloca que quando a
internação é prevista, pode ser feita uma visita hospitalar prévia, o que é
benéfico tanto para a criança quanto para os pais. Nas crianças muito pequenas
é necessário preparar as mães, para que possam lhes dar o suporte necessário,
sendo possível a internação antecipada e a presença constante da mãe. “Mães confiantes
e emocionalmente fortalecidas vão poder comunicar esta confiança a seus bebês e
filhos pequenos” (p.347).
Huerta
(1996) expõem que é necessário também preparar a família da criança, pois é
esta quem presta o cuidado e representa a proteção e o apoio do indivíduo. Uma
família melhor preparada terá mais condições de auxiliar a criança a enfrentar
essa experiência. Huerta (1996) ainda expõem que os pais se beneficiam em
acompanhar o preparo da criança, entretanto devem também ser preparados
separadamente para que possam expressar seus sentimentos e dúvidas, além de
solicitar informações adicionais, já que seu nível de compreensão é diferente
do da criança. De acordo com Calvetti e Cols. (2008) é importante ouvir os
familiares e esclarecê-los sobre suas dúvidas, acolhendo suas dificuldades e
buscando o fortalecimento da estrutura familiar. Os familiares representam uma
importante força afetiva, capaz de favorecer a recuperação do paciente.
Segundo Santos e Cols. (2013) a hospitalização
também traz efeitos às famílias, como estresse, mudanças no cotidiano, dúvidas
e insegurança, esperança, conflitos, etc. Pode ocorrer uma desestruturação
temporária da família em decorrência da hospitalização da criança. De acordo
com Kumamoto e Cols. (2004), deve-se trabalhar com os pais, observando o
estresse situacional, a dinâmica conjugal e, se necessário, oferecendo
psicoterapia. Os pais ou responsáveis pela criança devem ter um espaço de fala
e apoio individual, já que o adoecimento de uma criança estremece toda a estrutura
familiar.
De
acordo com Souza e Cols. (2008) os pais têm um papel importante no preparo da
criança para hospitalização e intervenções que possam ocorrer. Muitas vezes não
existe a preocupação de tentar explicar para a criança o que está acontecendo,
sendo que diversos problemas advém desta falta de explicação sobre o que esta
ocorrendo e o motivo dos exames realizados e medicamentos aplicados. Os pais
são as pessoas mais significativas para a criança, portanto é importante que a
criança os sinta seguros e receba explicações destes. Sendo que os pais devem
também preparar-se, controlar seus sentimentos diante da doença do filho, e,
considerando a idade da criança e seu nível de entendimento, não devem tentar
mascarar a situação, entretanto, aspectos julgados irrelevantes podem ser
omitidos.
Santos
e Cols. (2013) colocam que no momento em que a criança é internada ela deixa a
segurança de seu lar. A criança tem medo do desconhecido, da dor, da anestesia,
da morte e de ficar desfigurada ou incapacitada, especialmente aquela que é
incapaz de compreender o propósito da hospitalização e as experiências as quais
será submetida, pode sofrer alterações psicológicas como pesadelos, enurese,
agressividade e mal humor. A falta ou até mesmo a omissão de informações sobre
os procedimentos a serem realizados com a criança trazem efeitos negativos. De
acordo com Castro (2007) o impacto da hospitalização e enfermidade sobre a
criança dependerá “da duração, da sintomatologia, da gravidade, da visibilidade
da doença, dos tipos de intervenções médicas que requer, das características da
criança e das relações familiares” (p.401). O processo de hospitalização pode
gerar consequências imediatas para algumas crianças, como mudança de
comportamentos, pesadelos e medo de separar-se de seus pais.
Segundo
Kumamoto e Cols. (2004) no passado, a criança hospitalizada era separada de sua
família, o que poderia desencadear distúrbios emocionais em graus variados,
após ter-se chegado a esta conclusão foi feita uma mudança significativa que
promovia o envolvimento das famílias nos cuidados da criança internada, dando a
garantia do direito de ter um acompanhante durante todo o tempo de sua
internação. Mesquita e Cols. (2013) expõem que é necessário estar atento ao
desenvolvimento físico e mental da criança no processo de hospitalização, sendo
importante a atenção as variáveis psicológicas da criança hospitalizada, bem
como da família, com objetivo de prevenir transtornos que possam comprometer o
desenvolvimento da criança ou agravar seu quadro clinico. De acordo com
Calvetti e Cols. (2008) há ainda um agravante quando a criança se encontra na
Unidade de terapia Intensiva (UTI), pois aqui a criança não pode se deslocar,
está isolada, com horários de visita curtos e sujeita a inúmeros procedimentos
e aparelhos. A UTI também carece de uma atenção efetiva para o cuidado do
paciente com uma equipe multidisciplinar.
Durante
a internação as crianças sofrem uma série de transformações psicológicas. Elas
chegam ao hospital com uma visão de si e do mundo, a qual é modificada a partir
das experiências vividas nesse contexto. Na maioria das vezes essas crianças
passam por um processo de despersonalização, elas são obrigadas a cumprirem a
rotina hospitalar, que as padroniza, vestindo-as iguais, estipulando rigorosos
horários de visitas, banho, alimentação, etc. Além de desenvolver uma
insegurança em relação ao ambiente, se a criança apresentar ou sofrer alguma
desfiguração física esse quadro tende a se agravar, pois ela também pode
desenvolver uma insegurança em relação à família, ao tratamento e à equipe
hospitalar (Souza e Cols., 2008, p.5).
Calvetti
e Cols. (2008) colocam que a criança vê o hospital como um ambiente
desconhecido e restrito de possibilidades de atividades como o brincar.
Representando solidão, tristeza e saudades de casam da família, dos amigos, dos
colegas e da escola. Segundo Kumamoto e Cols. (2004) o afastamento da família e
da escola e também o complicado e desconhecido ambiente hospitalar pode levar a
criança a experimentar uma sensação de desamparo, apresentando reações como:
atitudes regressivas, fobias, transtornos comportamentais inadaptativos, etc.
Todos
os procedimentos a serem realizadas precisam ser explicados para a criança, com
objetivo de amenizar seus medos e as fantasias que tem diante do ambiente e das
situações desconhecidas. Passando muitas vezes por procedimentos invasivos que
não respeitam a intimidade da criança. Também pode-se estimular a família a
trazer os objetos preferidos da criança, como brinquedos, na tentativa de
auxiliá-la a manter o vínculo com seu lar, e assim tornando o ambiente
hospitalar mais humanizado e familiar (Calvetti e Cols., 2008). Segundo Huerta
(1996) devido a seu desenvolvimento estar ainda em maturação, a criança
apresenta recursos limitados para enfrentar situações dolorosas ou
desconhecidas, recorrendo geralmente à fantasia para superar o medo, a
frustração e a dor, pois ainda está construindo seu raciocínio lógico, o que
torna difícil considerar razões reais para a experiência. Tal fato faz com que
a criança possa interpretar de forma errônea os procedimentos dolorosos e
invasivos aos quais é submetida, podendo interpretá-los como castigo ou punição
e assim sentir-se culpada. Huerta (1996, p.342) coloca que:
Torna-se
então necessário proporcionar à criança recursos que lhe facilitem a percepção
da realidade da experiência e de seu propósito, bem como dar-lhe o apoio que
lhe permita expressar em segurança e de acordo com seu nível de
desenvolvimento, as emoções decorrentes da mesma. Quando a criança compreende a
verdadeira finalidade do procedimento, ela é capaz de tolerar melhor o
desconforto e a dor.
Segundo
Kumamoto e Cols. (2004) há uma redução do medo quando se oferece à criança
esclarecimentos e estratégias capazes de fornecer a segurança necessária para
superar esta nova situação. De acordo com Huerta (1996) deve ser oferecida a
criança explicações honestas, curtas e simples, de acordo com seu nível de
desenvolvimento, que possam transmitir confiança no procedimento e nos
resultados dele esperado. Lembrando que os procedimentos médicos incluem o
antes, o durante e o depois. Sendo importante preparar também a criança para
cuidados posteriores, como curativos, medicação, retirada de pontos, coletas,
exames, infusões intravenosas, etc. Além de continuar a elaborar as emoções e
idéias ou percepções acerca do procedimento.
Segundo
Mesquita e Cols. (2013) faz-se necessário manter, mesmo no hospital, as
características do universo infantil. Sendo positivo à criança poder brincar no
hospital. Kimamoto e Cols. (2004)
colocam que a criança hospitalizada tem mudanças significativas em sua rotina,
tendo privações afetivas, cognitivas e lúdicas que podem repercutir em sua
saúde, além de ser submetida a experiências dolorosas. Neste contexto, o
brincar é uma tentativa de transformar e humanizar o ambiente hospitalar,
proporcionando melhores condições à criança. Calvetti e Cols. (2008) defendem
que é extremamente importante possibilitar o brincar da criança e promover
atividades lúdicas possíveis no ambiente hospitalar, sendo utilizado como
recurso adequado para melhor adaptação da criança ao hospital.
Kumamoto
e Cols. (2004) afirmam que durante a hospitalização não é saudável a privação
do brincar. Jogos simbólicos e atividades lúdicas como desenho ou contação de
histórias, utilização de massa de modelar ou bonecos facilitam a assimilação da
realidade e compreensão da criança, auxiliando na criação de estratégias de
enfrentamento frente à doença, a internação hospitalar e os procedimentos
médicos. “Brincando os resultados são surpreendentes, na medida em que,
enquanto brincam, as crianças conseguem exprimir seus medos, falar sobre a
doença, sobre o tratamento, o hospital, a saudade da família, sobre a morte
etc.” (Souza e Cols., 2008, p.9). Por
meio do brinquedo a criança se apropria da experiência dolorosa, o que permite
passar de uma posição de passividade para uma posição ativa que lhe restitui a
sensação de controle sobre sua vida. Mesmo doentes as crianças necessitam
brincar, e assim aproveitar seus recursos para elaborar a nova situação que
estão vivendo. “Através da atividade lúdica, a criança vai demonstrando ou
verbalizando seus medos, dúvidas, alegrias, tristezas, raiva entre outros
sentimentos, muitas vezes reprimidos e mal compreendidos por ela mesma.”
(Kumamoto e Cols., 2004, p.4). O brincar funciona como ferramenta que
proporciona melhores condições psicológicas à criança que está enfrentando uma
hospitalização. Huerta (1996) também expressa a importância do brincar para a
criança, como um meio de elaborar o que lhe está ocorrendo. Representar a
experiência no brinquedo faz com que a criança passe de sujeito passivo para
ativo, capaz de controlar a situação. “O brincar é a forma infantil da
capacidade humana para lidar com as experiências e dominar a realidade”
(p.351).
Huerta
(1996) explica que é uma prática construtiva permitir que a criança manuseie e brinque
com objetos que serão usados em sua intervenção, como máscara, gorro, pinça,
curativo, etc. Familiarizar-se com estes objetos pode diminuir a ameaça
habitualmente associada a eles. Também é positivo utilizar bonecos e objetos
para a dramatização dos principais aspectos do procedimento ao qual a criança
será submetida. O desenho e a contação de estórias também são técnicas
benéficas na preparação da criança, permitindo que a criança desenhe e utilize
técnicas menos ameaçadoras em terceira pessoa para contar a estória de uma
criança e o que ela faz no hospital.
De
acordo com Castro (2007) o profissional pode utilizar da brincadeira
interpretativa com a criança, a fim de recriar as percepções desta acerca de
suas experiências, permitindo sua expressão. Assim como os desenhos que podem
ser utilizados pela criança para ilustrar suas preocupações, medos e fantasias.
Kumamoto e Cols. (2004) ressaltam a necessidade de estabelecer uma comunicação
terapêutica informativa entre a criança e o médico, sendo esta uma estratégia
de enfrentamento da angústia, do medo e das fantasias irreais e assustadoras
que a criança tem frente à hospitalização. Os autores ainda destacam a
importância da visita de irmãos da criança, como um fator importante de
recuperação, assim como a continuidade das atividades lúdicas e pedagógicas
próprias desta etapa de desenvolvimento. Tendo como possibilidade futura a
criação de “classes hospitalares” (p.7), sendo importante para o resgate dos
aspectos saudáveis da criança e de sua infância, mesmo estando enferma e
hospitalizada. As unidades pediátricas hospitalares deveriam desenvolver
atividades lúdicas e aulas escolares, como maneira de não afastar a criança de
sua infância e de seus interesses de aprendizagem e desenvolvimento, o que também
contribui para que não passem todo o tempo preocupadas com sua enfermidade
(Castro, 2007). Kumamoto e Cols. (2004) também exprimem que, para as crianças
que ficam internadas por longos períodos também, é saudável oferecer atividades
lúdicas comemorativas, a fim de esquecer um pouco a sua doença e ligarem-se com
a realidade do mundo esterno ao hospital.
Huerta
(1996) também expõem que é válido apresentar a criança á equipe de saúde, além
de comunicar à criança sobre onde estarão seus pais enquanto ela se encontra em
procedimento. Também é positivo encorajar os pais para que fiquem o maior tempo
possível com as crianças, particularmente as pequenas, além de permitir que a
criança tenha consigo um objeto significativo, como seu brinquedo favorito, por
exemplo. Quando o procedimento requer anestesia é importante providenciar para
que a criança se recupere na presença de seus pais. Também é benéfico elogiar a
criança, pois ela precisa ouvir que se sabe que ela fez o melhor que podia na
situação em que estava, independentemente de qual tenha sido seu comportamento.
De
acordo com Huerta (1996) mesmo que o preparo adequado ofereça condições para
que a criança expresse suas emoções, não é capaz de mudar imediatamente seu
comportamento, sendo assim, nunca se deve esperar que a criança não chore ou
reaja. A submissão reflete também falta de preparo, quando a criança ignora o
que lhe espera, sendo reação de um intenso bloqueio emocional. Souza e Cols.
(2008) explicam que a criança normalmente reage negativamente à hospitalização,
chorando e demonstrando medo e ansiedade. Aquelas crianças que são consideradas
mais fáceis de lidar, por serem obedientes e passivas exigem cuidados extras,
pois pode tratar-se de uma criança que pode estar em desequilíbrio psicológico,
e por tanto aceita a situação sem reclamar ou questionar.
Um
dos objetivos do preparo é ajudar a criança a enfrentar da maneira mais sadia
possível aquilo que não pode ser evitado e o resultado, eminentemente
individual, é uma reação de medo adequada à realidade da experiência, isto é,
uma reação diferente do pânico por um lado e da negação por outro, pois ambos
implicam na perda de contato com a realidade (Huerta, 1996, p.351).
Mesquita
e Cols. (2013) ressaltam que é um dos objetivos do psicólogo da saúde avaliar
os processos psíquicos do paciente que enfrenta procedimentos médicos, buscando
a promoção e recuperação do sujeito em nível “biopsicosocioespirituambiental”
(p.89), podendo identificar e prevenir os possíveis problemas psicológicos
causados pela hospitalização da criança. “A psicologia da saúde tem como
objetivo compreender como os fatores biológicos, comportamentais e sociais,
influenciam na saúde e na doença” (Calvetti e Cols., 2008, p.230). De acordo
com Souza e Cols. (2008) o psicólogo busca compreender os aspectos emocionais
no tratamento do paciente infantil, promovendo seu desenvolvimento sadio e
pleno. Este profissional, embora muitas vezes subestimado no campo da saúde, é
parte fundamental de uma equipe hospitalar multidisciplinar, podendo trabalhar
junto com esta equipe e respeitando os limites institucionais, é capaz de
auxiliar para uma melhor qualidade de vida do sujeito hospitalizado,
lembrando-se sempre que ali não está uma doença, e sim um indivíduo enfermo.
Segundo Kumamoto e Cols. (2004) visa-se a promoção à saúde e o atendimento
integral à criança, olhando não apenas para a ordem física, mas também
psicossocial, em que o brincar insere-se como fator essencial à recuperação e
desenvolvimento infantil.
A
Psicologia Hospitalar, respeitando as limitações provindas da doença, tenta
suprir as necessidades, não só orgânicas, mas também as que se referem ao
psicológico e educacional da criança. O psicólogo trabalha para manter o
equilíbrio, muitas vezes perdido durante o período de internação. Esse
desequilíbrio ocorrido na criança durante a hospitalização esta diretamente
ligada à retirada do convívio familiar, a privação das brincadeiras e da vida
escolar, sendo obrigada a se envolver em tratamentos e relacionamentos com
pessoas estranhas em situações imprevisíveis, onde se encontram bastante
fragilizadas (Souza e Cols., 2008, p.3).
A
tarefa da equipe de saúde ao atender uma criança hospitalizada é “proteger e
favorecer seu desenvolvimento integral, e não apenas restaurar e manter sua
saúde física” (Huerta, 1996, p.351). Souza e Cols. (2008) colocam que o
trabalho com crianças exige do profissional sensibilidade e paciência. É
importante ressaltar que o trabalho que o psicólogo pode desenvolver no
contexto hospitalar, com paciente, equipe e família, depende também da
estruturação pessoal do profissional, já que o psicólogo recebe sentimentos
como impotência, medo, angústia, ansiedade, etc. Tendo que conviver com estes e
administrá-los em seu cotidiano, sendo importante também o tratamento pessoal
do profissional, pois só refletindo sobre as próprias angustias e dificuldades
é possível realizar um trabalho adequado. É exigido do profissional grande
habilidade comunicativa e relacional, tanto com a criança quanto com sua
família, além do conhecimento acerca do desenvolvimento humano e da dinâmica
daquela família. Também é importante a habilidade para trabalhar em equipes
interdisciplinares (Huerta, 1996).
Sebatiani
& Maia (2005) explanam que a psicologia da Saúde/Hospitalar utiliza os
conhecimentos teóricos da psicologia aplicando-os nos processos de saúde e
doença, internação e tratamento, aonde se relacionam pacientes, famílias e
equipes. Utilizam-se técnicas e teorias a fim de atender as demandas da pessoa
hospitalizada, como também os comportamentos do paciente que podem agravar seu
quadro ou dificultar seu processo de recuperação. Não podendo mais os
psicólogos ficar presos aos métodos tradicionais do fazer da profissão. Segundo
Kumamoto e Cols. (2004) faz-se necessário refletir sobre o papel profissional
do psicólogo e sobre as adaptações teóricas e praticas, tendo um afastamento
dos modelos convencionais de intervenção psicoterápica a fim de permitir uma
aproximação real do individuo dentro de seu contexto social e histórico,
podendo estabelecer uma verdadeira relação de ajuda.
Segundo
Castro (2007) a tarefa principal do profissional da psicologia dentro do
contexto hospitalar é auxiliar o paciente e sua família a melhorar a qualidade
de vida e o bem-estar, considerando a saúde um conceito multidimensional que
abrange aspectos físicos, psicológicos, sociais, ambientais e espirituais.
Calvetti e Cols. (2008) expõem que é parte do intuito do psicólogo facilitar a
recuperação da criança e sua participação ativa, estimulando seu
desenvolvimento afetivo, visando à qualidade de vida do paciente tendo uma
visão e uma ação humanizadas ao sujeito neste ambiente.
Frente
às situações relacionadas à saúde da criança e do adolescente, é fundamental
uma abordagem multiprofissional que envolva também os aspectos psicológicos da
criança/ adolescente e suas famílias. É necessário que os profissionais da
saúde estejam sensibilizados para os aspectos que transcendem o tratamento
médico, pois os resultados do tratamento e as intervenções podem ficar
comprometidos se não se consideram esses aspectos (Castro, 2007, p.404).
CONCLUSÃO
De
acordo com Souza e Cols. (2008) muitas vezes a equipe de saúde considera apenas
o estado físico e orgânico do indivíduo, estando despreparadas em relação aos
aspectos mentais e sociais que podem afetar o paciente. Kumamoto e Cols. (2004)
colocam que a doença afeta a criança em todas as dimensões, corporal, afetiva,
cognitiva e social. Souza e Cols. (2008) ainda exprimem que a enfermidade e a
hospitalização da criança podem causar vários efeitos psicológicos negativos,
como depressão, ansiedade, regressão, baixa auto-estima, negação da doença,
solidão, sentimento de culpa e sensação de punição, interrupção ou atraso
escolar, entre outros. Os efeitos dependem da subjetividade de cada individuo,
variando também com a situação social, familiar, econômica, com a personalidade
do sujeito e com o tipo de enfermidade. Na hospitalização infantil, um forte
fator desencadeante destes efeitos negativos é a separação da criança de sua
mãe, dependendo também da idade da criança, das atitudes da equipe, da rotina
hospitalar, da duração da internação, etc. Sendo importante levar em conta a
história de vida do sujeito, o contexto social, a comunidade em que habita, a
estrutura familiar e financeira, além do relacionamento entre médico, paciente,
família e equipe de saúde (Mesquita e Cols., 2013).
A
hospitalização é, geralmente, realizada num ambiente de tensão e insegurança
para crianças, adolescentes e seus acompanhantes, podendo acarretar outras
situações desagradáveis em sua rotina, tais como: novos horários, exames
dolorosos, afastamento do ambiente familiar, abandono das atividades escolares,
falta de estímulo social, dentre outras alterações no cotidiano das crianças e
de seus familiares. Essas modificações podem ocasionar agitação, gritos,
choros, retrocessos, regressão, depressão, ausência no controle dos
esfíncteres, entre outros (Santos e Cols., 2013, p. 46).
De
acordo com Mesquita e Cols. (2013) o conceito de saúde é multidimencional,
considerando os aspectos biológicos, psicológicos, sociais, espirituais e
ambientais do sujeito. Sendo necessário ao psicólogo estar atento e treinado
para lidar com situações complexas, que envolvem o bem estar da criança, mas
também de todos que a rodeiam. Tendo enfoque interdisciplinar, trabalhando de
forma integrada com os demais profissionais da saúde, a fim de proporcionar uma
experiência menos traumatizante, com melhor bem estar e qualidade de vida.
Castro
(2007) explica que a compreensão que a criança tem acerca da doença é um fator
importante para sua adaptação ou não. Podendo a criança entender a doença como
uma mudança ou perda irreparável, um castigo, uma oportunidade de não ir à
escola ou de atrair a atenção dos adultos a sua volta, uma oportunidade de
desenvolvimento pessoal e crescimento, entre outros. Castro (2007) coloca que a
criança é a fonte de dados mais confiável sobre si e sobre o que as preocupa.
“A doença não fala, o doente sim.” (Mesquita e Cols., 2013, p.92). A
recorrência de internações e experiências médicas estressantes pode prejudicar
o desenvolvimento emocional, cognitivo, físico e social da criança (Castro,
2007). A reação do paciente está relacionada à sua historicidade (Calvetti e
Cols., 2008).
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Artigo não publicado oficialmente - por favor, não plagie!!!