domingo, 4 de julho de 2021

Análise Crítico Reflexiva: A História da Psicologia da Saúde no Brasil

 

Sebastiani, R. W. (2003). Psicologia da Saúde no Brasil: 50 Anos de História.
Suma psicol; 10(1):25-42.

 


A doença não é mais vista como individual, mas social. O paciente não é mais passivo, mas deve assumir papel ativo em seu processo saúde-doença. Sendo responsável por si e adquirindo comportamentos mais saudáveis. O fenômeno saúde e doença é mutifatorial, sendo assim, está ligado também a causas sociais, culturais e econômicas. A dimensão biopsicossocial do processo de saúde e doença é um espaço inquestionável da atuação da psicologia, com a intenção de melhorar as condições de saúde e a qualidade de vida do ser humano, promovendo a saúde e prevenindo a doença, a partir do comportamento e do estilo de vida do sujeito. De acordo com Souza & Delevati (2013) as doenças, na atualidade, estão mais relacionadas ao estilo de vida dos sujeitos, as causas ambientais, ecológicas e padrões comportamentais. A mortalidade acentuada de comunidades urbanas e industrializadas está diretamente associada aos estilos de vida da população, ao stress e às emoções resultantes dos estilos de enfrentamento, a padrões de condutas, crenças e atribuições. Os problemas em relação à habitação, serviços urbanos e contaminação ambiental tendem a agravar a situação do individuo, unidos ao uso de substâncias, como o álcool e a condutas anti-sociais. Sendo intensificadas também pelos problemas em infra-estrutura e políticas sanitárias afetadas pela constante crise. Neste cenário busca-se repercutir a idéia de que a saúde se trata de um dos valores mais importantes do ser humano.

 

O presente artigo expõe uma linha do tempo da Psicologia da Saúde no Brasil, que se inicia na década de 50, antes mesmo da regulamentação da psicologia como profissão, que ocorre na década de 60. Sendo o Brasil o país que mais precocemente iniciou os trabalhos no campo da Psicologia da Saúde. Os primeiros movimentos para oficializar a psicologia no Brasil datam do início dos anos 50. Porém, já havia inúmeros profissionais atuando desde a década de 20. No início dos anos 60 a Psicologia é reconhecida oficialmente como profissão no país, e há então uma expansão de várias iniciativas de psicólogos com o intuito de desenvolverem seus trabalhos vinculados a hospitais gerais. Na mesma década, iniciam-se atividades voltadas a atenção à saúde da população com a participação de psicólogos, já expandindo seu campo de atuação para além dos consultórios. Na década de 40 o Brasil adotou uma política de saúde predominantemente assistencialista, de atenção secundária, em detrimento à sanitarista, de atenção primária, o que ainda reflete na prática do Psicólogo da Saúde Brasileiro. A partir da década de 70 houve grande desenvolvimento na área acadêmica em relação à Psicologia da Saúde.  Na década de 80 passou-se a vivenciar grande produtividade no campo da Psicologia da Saúde, sendo cada vez maior o numero de psicólogos recém formados a procurar a área de Psicologia da Saúde para desenvolver seus trabalhos.

 

Em 1983, quando havia mais duvidas do que certezas, o Conselho Regional de Psicologia exprime que a psicologia hospitalar ou da saúde, tem suas particularidades que a diferenciam das outras práticas de psicologia, como a multidisciplinaridade, ação em ambiente aberto e variável, tempo limitante, morte e morrer como presenças constantes no ambiente de trabalho, necessidade de uma visão multifatorial do paciente, abrangência maior de conhecimentos específicos e possibilidade de inúmeras intervenções, com pacientes, famílias, profissionais da saúde, entre outros.

 

O trabalho multidisciplinar na psicologia permite mais do que explicar o sofrimento do paciente, mas tenta compreender este sofrimento, articulando com a sua realidade existencial (Souza & Delevati, 2013). Segundo Castro & Bornholdt (2004) o trabalho interdisciplinar é essencial dentro da Psicologia da Saúde. Essa área fundamenta seu trabalho principalmente na promoção e na educação para a saúde, visando a prevenção. Contudo o profissional da psicologia não se mostra preparado para esta realidade.

 

Nos mais de 50 anos de história da Psicologia da Saúde pode-se constatar um crescimento constante da área como ciência e profissão, entretanto, não se consideram todos os objetivos alcançados. A presença do profissional de psicologia junto a estas demandas é historicamente muito curta, se comparada ao tamanho dos problemas que se enfrenta, sendo considerado que a população encontra-se minimamente bem assistida, exigindo ainda grande trabalho porvir.

 

A Psicologia da Saúde tem sido considerada um campo de trabalho da Psicologia que nasce para dar resposta a uma demanda sócio-sanitária. Tendo destaque na multidisciplinaridade, mas sem negar a psicologia como fonte. Entretanto, Sebastiani (2003) expõe uma insuficiente incorporação de psicólogos ao campo da saúde, sendo a formação limitada é insuficiente para esta atuação. Constatou-se que, em 2003, haviam aproximadamente 100.000 psicólogos registrados no Conselho Federal de Psicologia, mas apenas 20% atuavam na área específica da Psicologia da Saúde. Mesmo sendo a área que mais tem absorvido psicólogos nos últimos 15 anos, sendo uma alternativa ao gradativo esvaziamento dos espaços antes ocupados pelas atividades de consultório, pautada num modelo clinicalista já desgastado. Castro & Bornholdt (2004) colocam a estatística que: “54,9% dos psicólogos que exercem a profissão trabalham na clínica em consultório particular, enquanto apenas 12,4% dos profissionais atuam em Psicologia da Saúde e 0,6% são pesquisadores.” (p. 53) De acordo com Castro & Bornholdt (2004), a Psicologia da Saúde demonstrou rápido crescimento em recursos humanos, mas uma insuficiente incorporação dos psicólogos nos setores de saúde. Tendo ainda uma produção cientifica escassa.

 

Com esta migração de área dos psicólogos há uma necessidade de buscar novas referências e instrumentos, diferentes das aprendidas na formação. A Psicologia da Saúde foi, aos poucos, adquirindo sua própria identidade, entretanto tem sido as ferramentas da psicologia clinica e tradicional que ainda tem predomínio na graduação. Sebastiani (2003) critica que ao longo dos últimos anos a academia tem se afastado cada vez mais das questões sociais. Refletindo na graduação deficitária e insuficiente para a prática do Psicólogo da Saúde, que sai da formação sem possuir conhecimento ou experiência da realidade clinica e sanitária do país. Apenas uma minoria de recém formados ingressa nos sistemas de saúde e instituições hospitalares, e muito poucos profissionais nos serviços de atenção primária. O numero de psicólogos recém formados desempregados aumenta gradativamente, já que a prática em consultório particular se torna cada vez mais difícil devido aos problemas socioeconômicos e da falência gradativa dos modelos tradicionais.

 

Souza & Delevati (2013) defendem que é faz necessário investir em uma formação adequada, capaz de habilitar o profissional a realizar uma analise critica da realidade brasileira, permitindo assim detectar alternativas de intervenção e ser capaz de acompanhar e responder as demandas sociais e políticas para melhoria da qualidade de vida. Aonde se justificaria a formação generalista em psicologia, que capacita a problematização e a busca de soluções a partir de conhecimentos teóricos e práticos, tendo a ética como base, além de currículos flexíveis. O curso de graduação deveria ser entendido como inicio de um longo percurso de formação continuada. É necessária uma formação que o habilite a realizar uma analise critica da realidade brasileira, sendo capaz de intervir, acompanhar e responder as demandas sociais e políticas para melhoria da qualidade de vida.

 

Castro & Bornholdt (2004) expõem que a psicologia, por vezes, parece um retrato, um reforço a desigualdade, com práticas elitistas que beneficiam uma pequena parcela da população. O psicólogo passou a se depara com problemas que escapam do domínio da clínica tradicional, mas dizem respeito às condições de vida da população. Houve uma diminuição da procura de clientes em consultórios particulares devido ao empobrecimento da população, o que levou os psicólogos a trabalharem com pessoas mais carentes, tornando seu serviço mais acessível. Os autores acreditam que quando o individuo não tem como ir ao psicólogo, o psicólogo deve ir até o indivíduo.

 

Segundo Souza & Delevati (2013) a psicologia vem buscando expandir seu campo de atuação, esta mudança é vista na reestruturação curricular dos cursos de psicologia, sendo comuns disciplinas que enfocam a psicologia comunitária, institucional, hospitalar, esportiva, forense, etc. A mudança da prática de psicologia reformulou também o campo teórico. O que permitiu uma nova visão de ser humano que levasse em conta sua historicidade, havendo assim uma abrangência do contexto social em que o individuo está inserido. O Profissional de psicologia, ao se inserir na realidade de sua atuação vai se redefinindo e buscando espaços, propondo novas formas de compreensão de ser humano, e assim também uma nova forma de lidar com esta pessoa, que faz parte do contexto sociocultural (Souza & Delevati, 2013).

 

Souza & Delevati (2013) ainda colocam que o psicólogo da saúde deve ter uma atuação de compromisso com o contexto social. A prática da Psicologia da Saúde deve envolver serviços a comunidade, o ensino e a pesquisa, dentro da realidade brasileira, construindo um novo saber, pautada em uma abordagem holística, ira apresentar uma nova perspectiva para a prática clinica. Não há como separar psicologia e saúde. A Psicologia precisa ter como campo de atuação a própria realidade contemporânea.

 

 


Referências:

 

Castro, E. K., & Bornholdt, E. (2004). Psicologia da Saúde x Psicologia Hospitalar: Definições e Possibilidades de Inserção Profissional. Psicologia Ciência e Profissão, 24 (3), 48-57

 

Souza, A. R. B; & Delevati, D. (2013). O Fazer do Psicólogo na Saúde. Cadernos de Graduação. Ciencias Biologicas e da Saúde Fits, Maceió. V.1, n.2, p.79-87.


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